Para adentrar no universo do espectro autista devemos levar em conta diversos fatores, dentre eles a capacidade sensorial. O Sentir da criança autista deve ser desenvolvido, compreendido e por vezes adaptado de forma correta para o desenvolvimento gradativo de qualquer tipo de limitação ou sensibilidade, por vezes excessiva, que possa apresentar.
A Dra. Márcia Valiati é terapeuta ocupacional e trabalha com o estímulo sensorial da criança autista. Explica que é comum a criança com autismo procurar sensações, portanto, ela pula, belisca, mastiga, roda e tenta ao máximo manter o nível de alerta. “Podemos pensar na criança hiperativa que necessita de estímulos proprioceptivos para que ela possa se organizar. As crianças que colocam tudo na boca, isso é uma procura sensorial tátil”, explica. A especialista cita a procura sensorial auditiva, também comum entre as crianças autistas: “Elas buscam barulhos estridentes e até reproduzem esses sons com objetos”, completa.
Para adequar o tratamento a Dra. Márcia salienta que primeiro é preciso notar se a criança é hiporresponsiva (hipo) quando tem a sensibilidade baixa, sendo necessário usar estímulos para aumentar o nível de excitação ou quando é hiperresponsiva (hiper) são realizados procedimentos opostos: “Diminui a intensidade, a excitação, a entonação. Falamos num tom mais baixo, pausadamente para que a criança possa ir se acomodando e atingindo um nível ideal para receber todos os estímulos necessários”, conclui.
O objetivo da terapia, de acordo com a médica, além de reduzir as dificuldades comuns no campo sensorial é contribuir para o comportamento adequado da criança. “Os estímulos corretos são essenciais para a criança ser capaz de realizar as atividades do dia a dia, incluindo autocuidado, brincar e tarefas escolares”, orienta.
Por que a autoagressão?
A terapeuta comenta sobre alguns comportamentos questionados pelos pais que causam bastante incômodo. Dentre eles está a agressão: “Os estímulos são tão intensos para essas crianças e desregulados que ela pode reagir com agressão, ou seja, ela se auto-agride ou atinge quem estiver mais próximo”, explica. “A ansiedade ou o contato com o desconhecido faz com que essa criança também se desorganize e para isso temos que regular esse comportamento”.
De acordo com a Dra. Márcia a criança autista tem dificuldade de planejar a percepção de tempo, ordenar a memória e autorregulação mental, pois não recebe adequadamente todas essas informações. “O pobre controle faz com que a criança tenha uma impulsividade e seja desatenta. Graduar esses desafios sensoriais é o objetivo da terapia”.
Incentive a aceitação dos objetos e sensações
O primeiro passo é observar o que a criança tem tolerância. Se for ao toque, por exemplo, é preciso trabalhar gradativamente os desafios. “Utilize sempre que possível o teu corpo em relação ao corpo dessa criança. Faça com que ela tenha sensações, que ela experimente sensações corporais, como: na hora de deitar, coloque, enrole ela, faça brincadeiras dela com atrito com o colchão, no sofá jogue as almofadas. Tudo isso pode ser interessante e até faz parte de algumas atividades terapêuticas”, recomenda.
Permita que a criança se adapte as mudanças
Um dos equívocos entre os pais e educadores, de acordo com a terapeuta, é não dar tempo para que a criança experimente a sensação. A médica explica que ao oferecer um objeto é preciso insistir e trabalhar o tempo até que ela aos poucos aceite. “Não queira dar dez, doze estímulos. Dê um, dois e pronto. Permita que essa criança seja exposta a repetição para ela aprender a ação. Adicione gradativamente as novidades para que aumente as respostas, mas permita que a criança use”, argumenta.
Dra Márcia cita um dos costumes entre os pais que é oferecer um objeto, como uma escova, por exemplo, notar que a criança não gostou e nunca mais oferecer novamente: “Permita, deixe a escova ali do lado. Você pega, passa no seu braço, faz com que ela veja. Passa na boneca, ela vai ter essa sensação, vai ter a visão que você está gostando disso e também pode vir a experimentar”. Leia também: Trabalhando em prol do desenvolvimento da criança autista.
Guie a criança para o estímulo sensorial
Ao se tratar da criança com TEA a terapeuta explica que em alguns casos é necessário direcioná-la para o experimento através da ajuda física. “Muitas vezes você tem que pegar na mão e fazer com ela faça determinado movimento, determinada atividade, ou que experimente a tinta para que possa sentir a sensação”, recomenda. No caso da criança não gostar a médica cita como exemplo pingar uma gota de tinta para aumentar a tolerância em relação a atividade que no momento pode não ser satisfatória, mas pode evoluir.
Referências:
Congresso Nacional Online de Autismo: http://www.conautismo.com.br/
Corautista.org: http://www.conautismo.com.br/
Dra. Márcia Valiati, Terapeuta Ocupacional e Pedagoga
Doutora pelo programa de pós-graduação em saúde da criança e adolescente (UFPR)